sábado, 6 dezembro, 2025

o açaí como ativo global do século 21


Poucos frutos simbolizam tão bem a intersecção entre natureza, economia e saúde quanto o açaí. De alimento tradicional de comunidades amazônicas, ele passou a ocupar espaço de destaque nos mercados internacionais, sendo reconhecido como superalimento e protagonista em pesquisas científicas.

Essa ascensão global transformou o açaí em ativo estratégico da bioeconomia, atraindo a atenção de investidores, indústrias e consumidores em países da Europa, nos Estados Unidos e na Ásia.

No Brasil, o Pará consolidou-se como líder, responsável por cerca de 90% da produção.

O Amazonas, por sua vez, assumiu posição de destaque como segundo maior produtor, respondendo por aproximadamente 7,4% do total nacional, segundo a Fundação Amazônia de Amparo a Estudos e Pesquisas (Fapespa, 2023). A presença do açaí no Estado começou com a coleta tradicional da espécie Euterpe precatoria por povos indígenas e comunidades ribeirinhas.

A partir dos anos 2000, surgiram os primeiros cultivos tecnificados, especialmente em municípios como Humaitá, com a introdução da espécie Euterpe oleracea. Os produtores desenvolveram seus próprios experimentos de expansão e seleção, abrindo caminho para o que hoje se consolidou como uma cadeia produtiva robusta.

Essa estrutura vai desde viveiros de mudas até o beneficiamento industrial, com apoio de instituições como o Idam, a Sepror, a Conab e a Embrapa, que oferecem assistência técnica, políticas de incentivo, pesquisa científica e suporte logístico.

A cadeia produtiva não se limita ao fruto. Há toda uma rede de atores econômicos voltados ao substrato do açaí, incluindo o desenvolvimento de novas genéticas, o fortalecimento de viveiros, a industrialização em polpas, sorvetes e derivados, além da logística que conecta a floresta aos grandes centros de consumo do Brasil e do exterior.

Programas como o Projeto Prioritário do Açaí (PP Açaí) e a Política de Garantia de Preços Mínimos para Produtos da Sociobiodiversidade (PGPM-Bio) reforçam a importância desse arranjo produtivo, garantindo segurança e renda a milhares de famílias. Municípios como Codajás, Humaitá, Manacapuru, Itacoatiara, Parintins, Careiro, Anori e Anamã se destacam como polos de produção.

Um exemplo emblemático desse avanço é a Fazenda Açaizal, em Humaitá, onde o produtor Giuliano Quintino dos Santos iniciou, em 2003, uma propriedade de 400 hectares, dos quais 80 são destinados ao açaí. Com espécies precatoria e oleracea, a área já passou por renovações, substituindo plantas de 20 anos por novas genéticas mais produtivas.

Pioneiro em uma região sem referências técnicas, Giuliano contribuiu para a adaptação do cultivo no Amazonas. Sua produção abastece Estados vizinhos como Rondônia e Acre com fruto in natura, enquanto polpa, açaí processado e sorvetes seguem para Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro, Goiás, Pará, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e também para o próprio Amazonas.

Além de seu valor econômico, o açaí se destaca pelos benefícios à saúde. Rico em antioxidantes, associa-se à proteção cardiovascular, ajuda a reduzir os níveis de colesterol LDL e fortalece o sistema imunológico.

Sua combinação de vitaminas, fibras e gorduras insaturadas reforça a alta qualidade nutricional, ampliando e fortalecendo seu posicionamento no mercado. Essa junção de tradição alimentar e ciência moderna contribui para o aumento contínuo da demanda global, tornando o fruto cada vez mais presente no cotidiano de diferentes públicos.

A contribuição científica para o desenvolvimento do açaí no Amazonas também é significativa. A Embrapa tem papel central nesse processo, com destaque para o pesquisador Edson Barcellos. Com experiência em agronomia e especialização em dendê/cultura e açaí, ele atua em diversas frentes de pesquisa, como melhoramento genético e adaptação do cultivo às condições locais.

Em parceria com outras instituições, Barcellos promove transferência de tecnologia e capacitação de produtores, visando à sustentabilidade e competitividade da cadeia produtiva.

No Amazonas, o açaí representa muito mais que um fruto: é símbolo de identidade cultural, motor de desenvolvimento sustentável e ativo estratégico da bioeconomia. Ao articular tradição extrativista, inovação tecnológica e valorização ambiental, projeta sua relevância além da floresta. A cor roxa intensa demonstra que a Amazônia não é apenas guardiã da biodiversidade, mas também protagonista de soluções que unem saúde, economia e futuro.

O vigor desse fruto amazônico revela um horizonte em que inovação e tradição caminham juntas, confirmando o açaí como patrimônio da Amazônia com alcance verdadeiramente global.

O autor é coronel da Reserva Militar, especialista em Política e Estratégia (ADESG) e secretário de Estado Chefe da Casa Militar do Amazonas.

Foto: Pedro Guerreiro / Agência Pará



Fonte: bncamazonas

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